O problema
de ir é não saber como vai voltar.
Na
verdade, a volta é incerta. Eu corri, o chão tão bem encerado refletia a minha
pressa. Era o tipo de pressa boa, a que te faz correr como se você estivesse
indo buscar um prêmio. E eu estava.
O meu
portão era o último e eu a última para entrar. Tudo parecia muito confuso, como
se eu não entendesse o que ninguém falava, a comunicação não parecia existir e,
por alguns momentos, eu me perguntei se aquilo realmente estava acontecendo ou
eu era mesmo o problema. Mas nada
demais, a dor não era forte o bastante para superar a ansiedade. Eu olhava para
a tela acima das poltronas e esperava roendo as unhas uma informação sobre a
velocidade do avião, pedindo mais ainda para alguém anunciar que a velocidade
dobraria. Aproveitar um pouco mais, mesmo que fosse por alguns minutos, era
tudo o que eu queria.
Antes
mesmo de pousar eu liguei o celular, sabendo que era errado, e esperei que ele
vibrasse. Nada de vibrar, nada de pousar, nada da dor acabar. Pousou
direitinho, tudo certo. Oi mãe, cheguei bem. Mas ninguém me deixava sair,
quantos anos se passaram nesses minutos? Tudo parecia estar saindo do
protocolo, e eu a vi.
Nada como
amar alguém e ver que essa pessoa te espera depois de tanto tempo, como se
fosse a primeira vez. Nada como sentir frio na barriga, perceber que as pernas
não respondem do jeito que você gostaria, as mãos geladas te denunciam. Às
vezes o problema de ser fria é se preocupar demais quando se quer colocar algum
tipo de sentimento pra fora.
E sentir
era só o que eu conseguia fazer. Ainda não tive tempo de descobrir o que São
Paulo causa em mim, ainda não descobri qual é a saída de toda essa bagunça, mas
alguma coisa mudou. Eu olhei aqueles olhos claros e, pela primeira vez na vida,
eu pensei “Puta merda, encontrei o amor da minha vida”. Não é um pensamento tão
simples, nada ali era, como nunca foi. Porém, era leve. Sentir todo o amor do
mundo era fácil demais pra ser verdade. Vai ver que ao dividir com alguém o
peso acabe.
Nunca tive
listas de coisas preferidas, nunca escolhi qual era minha música ou livro
favorito, nunca decidi as melhores comidas ou os melhores amigos. Listas nunca
fizeram parte dos meus dias. Mas o tempo foi passando e uma atualização
automática foi feita: melhores dias da minha vida. Voltar não era mais uma
questão, largar muito menos. A parte da liberdade, de não ter ninguém pra te
olhar com desprezo, foi o ponto principal pra entender onde era o meu lugar. As
coisas faziam sentido e eu podia finalmente amar sem preocupação.
Ou quase.
Eu
percebi, tarde, que eu namorava a garota mais incrível de todas. E tarde
também, entendi o que ela me falava sobre estar longe. Eu segurei o choro, sem
sucesso, ao notar a falta que ela faz. Segurei o grito quando percebi que nossas
pernas entrelaçadas e nossos beijos fazem a vida ter sentido. Os dedos dela entre
os meus eram a minha direção e eu quase implorei para ter aquilo todos os dias,
no mínimo o resto da minha vida.
O tempo
passou rápido demais e a volta foi doída. Mais ainda por eu ter escolhido
deixar tudo o que eu sentia e todo o meu amor pra trás. Afinal, o lugar deles
era ali. Ao lado dela, igual o meu lugar também é. Dói não estar lá, dói não
poder estar.
Sinceramente, eu não voltei. Eu não quis
voltar e ainda não quero, ainda não assimilei o que é estar pela metade, ainda
não entendi porque o tempo passa rápido demais algumas vezes e em outras, quando
eu quase morro para que ele corra, ele me mata passando o mais devagar que ele
consegue.
O que tem
incomodado mais é perceber que o problema não é ir. O problema é voltar.
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