quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

enquanto sós

    Não foi como eu imaginava, mas como ela falou que ia chegar atrasada e já estava a caminho, achei melhor seguir em frente. Entrei sozinha, acompanhada apenas da minha jaqueta marrom, que uso quando desejo impressionar alguém. Na entrada do local duas estátuas recebiam os fregueses, poucas luzes amarelas marcavam o lugar, as pessoas eram apenas penumbras e as paredes completamente revestidas de pôsteres de filmes me chamavam atenção. O rock se misturava com as vozes das pessoas que conversavam, mas era agradável. O lugar era pequeno e fechado, e me sentei à mesa do canto para poder observar a decoração.

    Por um momento coisas passavam na minha cabeça e um tipo de frio na barriga me atingiu, não me lembrava mais como puxar assuntos ou fazer elogios. Afundei na cadeira, observei o lugar. A pouca luz não me deixava ver as pessoas com perfeição, mas o que eu podia ver eram grupos de amigos, uns casais e caras olhando para as meninas de outras mesas.

      Ela chegou uns quarenta e cinco minutos depois e me senti bem ao vê-la vindo em minha direção, sorri e ela estava linda como sempre. Sentou-se ao meu lado e pedimos algo para comer, ela pediu um suco e sorriu pra mim.

    - Parei de beber, esqueceu?

    Ri de volta e conversamos coisas sem importância até a comida chegar.

    Acho que precisávamos falar sobre tantas coisas, tantas coisas precisavam ser ditas e lembradas que preferi formar desenhos com palitos de dentes. Olhei pra ela, estava tão concentrada em mexer o suco com o canudo que imaginei que ela estava querendo que o silêncio continuasse, assim como eu. Me perguntei quanta coisa cabia naquele silêncio, achei que se falasse alguma coisa poderia estragar tudo, continuei olhando pra ela, que estava decidida em girar o canudo no copo. Imaginei como poderíamos ser felizes, como eu queria tê-la ao meu lado por muito tempo, imaginei como eu tinha que ter falado muitas coisas ao invés de apenas olhá-la e percebi, então, que em meio ao silêncio e um copo de suco, poderia caber uma vida, ou até duas.

      Vi os banhos de chuva, as risadas altas ou as abafadas, quem sabe uma estrada, uma praia. Escovas de dente, livros e copos sujos. Abraços, andando de mãos dadas comentando sobre aquele filme no cinema. Talheres, respirações, algumas lágrimas e brigas. A dedicação, o acordar com um beijo na testa e sentir a sensação de ter tudo no mundo. Idas a lugares idiotas, quedas, mordidas ou olhares que expressam tudo.

     Mas o silêncio bastava. Ocupava o lugar das palavras que precisavam ser ditas, ocupava o lugar do carinho ou de algum beijo, de uma decisão de querer estar ao lado por muito tempo. Ocupava o lugar das discussões, brigas.

    Ela me olhou, e era como se tudo o que eu havia pensado estivesse escrito ali em seu rosto, no seu olhar e, naquele instante, todo o tempo do mundo se estendia diante de nós. Todas as nossas escolhas estariam ligadas, como se nossos caminhos começassem a ser construídos para se cruzarem, fazendo parte um do outro por muito tempo, seguindo a mesma direção.

     E então eu não precisava de nada, nem de palavras ou de confirmação. O silêncio cumpriu o seu papel. Eu queria estar com ela. 

    Dividimos a conta, passamos pelas estátuas na saída e caminhamos lado a lado pela calçada. A puxei para os meus braços e a abracei, aproveitei o momento, sabendo que não sentiria seu toque outra vez.

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